A produção de leite em mamíferos tem sido tradicionalmente considerada a única existente. No entanto, à medida que os cientistas exploram a diversidade da vida na Terra, novas descobertas revelam outras espécies que também alimentam suas crias com substâncias semelhantes.
Um exemplo que se destaca é a Siphonops annulatus, um anfíbio pertencente à ordem Gymnophiona.
No início deste ano, pesquisadores do Instituto Butantan, no Brasil, fizeram uma descoberta intrigante. Os filhotes dessa espécie de cobra-cega, conhecida também como cecílias, recebem de suas mães, nos estágios iniciais de vida, um líquido que se assemelha ao leite.
Em um artigo publicado na revista Science, o biólogo Pedro Luiz Mailho-Fontana e seu orientador, Carlos Jared, que é diretor do Laboratório de Biologia Estrutural do Butantan, explicaram que o animal possui glândulas nas paredes do oviduto que produzem uma substância viscosa e transparente, expelida pela cloaca para alimentar os filhotes fora do corpo da mãe.
Análises bioquímicas dessa secreção revelaram que ela é extremamente rica em carboidratos e ácidos graxos, uma composição muito similar à encontrada no leite de mamíferos.
As matriarcas alimentam seus filhotes ao longo de cerca de dois meses e várias vezes ao dia. Esse comportamento também lembra a produção de leite nos mamíferos, com intenção de manter as crias satisfeitas.
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Sons parecidos
Além disso, durante o estudo, os pesquisadores notaram que os filhotes emitem sons quando estão com fome, um comportamento semelhante ao observado em mamíferos.
Em conclusão, parece haver uma correlação entre a emissão desses sons e a liberação de leite.
E não são apenas os mamíferos que têm essa associação. Algumas aves, como pombos, pinguins e flamingos, também alimentam seus filhotes com uma substância similar ao leite.
No caso dos pombos, o cirurgião inglês John Hunter observou em 1786 que tanto as fêmeas quanto os machos produziam um leite gorduroso e rico em proteínas no revestimento do papo da garganta.
A revista Smithsonian destaca considerar que as aves desenvolveram sua própria versão de leite e herdaram muitas características de seus ancestrais dinossauros. Ou seja, é possível que esses grandes predadores tenham cuidado de suas crias de maneira semelhante.
Outro exemplo fascinante é a aranha saltadora Toxeus magnus, que também fornece leite aos seus filhotes.
Em 2018, biólogos publicaram um artigo na revista Science descrevendo como ela produz gotículas de um líquido parecido com leite em um sulco em seu abdômen. Além disso, eles alimentam seus descendentes até que cresçam o suficiente para procurar alimento por si mesmos.
É o mesmo leite?
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Alguns estudos sobre substâncias que se assemelham ao leite não-mamífero frequentemente colocam a palavra “leite” entre aspas.
Isso ocorre porque o líquido não é exatamente idêntico ao encontrado em cachorros, gatos, vacas, etc., e não compartilha a mesma origem evolutiva.
Normalmente eles se referem a isso como uma substância semelhante ao leite, explicou Joshua Benoit, entomologista da Universidade de Cincinnati, nos Estados Unidos, à revista Smithsonian.
O leite, como é tradicionalmente entendido, é geralmente associado aos mamíferos.
No entanto, Benoit ressalta que “para todos os fins práticos, o ‘leite’ de outras espécies desempenha a mesma função, e até algumas das proteínas presentes são semelhantes”.
Especificamente, as moscas tsé-tsé produzem uma substância branca e rica em gordura, semelhante ao leite, que é secretada pelas fêmeas para nutrir seus filhotes, acrescenta o especialista.
Assim, por conta dessa observação, puderam notar que substâncias semelhantes ao leite surgiram várias vezes entre os artrópodes, os chamados invertebrados.
O conhecimento desses fatores em outras espécies modifica o que entendemos da produção do leite em mamíferos. Essa pode ser uma adição interessante nos nossos conhecimentos das espécies, mostrando como elas possuem características que se interligam.
Fonte: Globo
